Muitos atletas dizem: "Correr uma maratona não custa, o que custa é treinar para ela". Não concordo inteiramente. É verdade que a preparação de uma maratona exige disponibilidade de tempo, bastante rigor e muita disciplina de treino. Mas, para quem treina habitualmente, o trabalho específico para uma maratona é tudo menos monótono, pois como é muito variado, acaba por quebrar a rotina das corridas do dia a dia.
A minha preparação, seguiu um plano de doze semanas, elaborado atendendo às minhas capacidades e ao momento de forma em que me encontrava no início.
A minha preparação, seguiu um plano de doze semanas, elaborado atendendo às minhas capacidades e ao momento de forma em que me encontrava no início.
Assim, durante a semana, dividi os meus treinos entre os parques de lazer das Taipas e Ponte, nas margens do rio Ave. Foram semanas de treino diversificado, com rampas, séries curtas, médias e longas, corridas contínuas, corridas a ritmo progressivo e também os imprescindíveis 'trotes' ligeiros, essenciais para a recuperação entre os treinos mais desgastantes.
O domingo era resevado para os treinos longos, que variaram entre as 2h00m e as 2h30m de corrida. Todos estes treinos foram realizados na ciclovia Guimarães - Fafe, que tem uma extensão de cerca de catorze quilómetros. É uma pista em alcatrão com marcações a cada quilómetro, construída no final da década de noventa sobre a antiga linha do caminho-de-ferro desactivada em meados dos anos oitenta. Gosto particularmente de treinar nesta pista. A paisagem é muito agradável, tem um percurso bastante sinuoso e carregado de vestígios de outros tempos, que me transporta para a magia dos comboios.
Algumas vezes com chuva, outras com sol e muitas outras com uma neblina típica da zona montanhosa, bem cedo iniciava a minha 'viagem'. Com apenas dois quilómetros corridos sugia um pequeno túnel e aí, inspirado pela escuridão, a minha fantasia remetia-me para o comboio. Após a saída do túnel, aparece a antiga Estação de Paçô Vieira, votada ao abandono e à degradação, entre os escombros, onde a minha cabeça consegue vislumbrar um 'relógio imaginário' que diz se vou ou não no andamento certo.
Até Fareja, o percurso ligeiramente a descer, atravessa desfiladeiros e penhascos carregados de musgo entre o arvoredo denso e onde o nevoeiro se concentra nas manhãs frias de Inverno. Muitas vezes aí 'saltei para dentro do comboio' e parece que via pessoas de gerações passadas. Aquela mulher de avental e lenço na cabeça, com o rosto marcado pelos anos e as mãos calejadas do trabalho do campo, que levava dois cestos de hortaliça para vender no mercado da cidade. O homem de chapéu, cara rosada, fato e camisa engomada, com ar de lavrador abastado, que ia a Fafe cobrar umas pipas de vinho que tinha vendido a um taberneiro.
Perdido nestes pensamentos, volto à minha corrida, entretanto num antigo caminho que atravessava a linha-férrea, surge uma placa que o tempo quase apagou, a dizer: "Pare, escute e olhe!". Não paro, escuto os sinais do corpo que dizem que o ritmo é bom, olho em frente analisando o caminho, sigo numa passada certa, tal e qual uma locomotiva em movimento. Mais à frente surge Cepães, a sua antiga estação, agora transformada em bar, é local de paragem para cicloturistas procederam ao merecido abastecimento. Como a minha 'viagem' não pára, transporto uma garrafa de água na mão, para me ir abastecendo ao longo do percurso. Depois de uma ligeira subida, uma curva, mais uma curva contra curva e chego ao fim da 'linha', onde não existe vestígio algum da passagem dos comboios, mas no meu pensamento existe um guarda-linha de bandeira vermelha na mão e assobio na boca a indicar-me que tenho de regressar. O 'relógio imaginário' marca 1h06m e a minha viagem de regresso começa.
Como o percurso de regresso é mais difícil, a minha cabeça concentra-se mais no corpo, no movimento das pernas, no dobrar dos joelhos em contraponto com as rodas do comboio a deslizar pelos carris e a força que exerce ao subir pelo trilho. Os meus músculos estão mais quentes, apesar da dificuldade da subida, o meu ritmo é melhor. O comboio também não abranda e assim chegamos os dois a Guimarães, o comboio com a sua pontualidade característica e eu com a corrida de treino terminada no tempo exacto de 2h10m.
Amanhã parto para Roterdão, para no domingo correr a maratona. Levo na bagagem a mesma alegria e ansiedade, que em criança na Estação de Guimarães, pela mão do meu pai subi os degraus da carruagem para a minha primeira viagem de comboio.
Até ao meu regresso...Boas corridas!
6 comentários:
Olá.
Deve ser um belo espaço para treinar. Quando puder vou ter que ir conhecer esse percurso.
Espero que traga de Roterdão um excelente resultado, uma magnífica experiência e uma grande estória para contar. Espero ainda que a partilhe conosco com o talento que tem revelado até aqui.
Um abraço, boa maratona.
O que te desejo é que tenhas força nas pernas para cumprires os teus objectivos e quando chegares termos mais um motivo para fazer uma grande festa, e em Agosto ai estamos nós a treinar para a maratona do porto para mais uma maratona. Um grande abraço e boa sorte que também é preciso.
Pedro Nat
Muita sorte Zé! Porque o resto: vontade, alegria, optimismo e uma excelente preparação, isso já tu tens!
Que seja uma excelente viagem e uma melhor Maratona.
Já que não nos podes levar contigo, que tragas muitas coisas boas para nos contar.
Como sabes, estarei contigo!
Um beijinho e muito sucesso (o que quer que seja que isso signifique para ti!)
Ana Pereira
Olá José!
Espero que você realize uma ótima prova, com muita energia e alegria!
Estaremos ansiosos para o seu retorno, contando como foi tudo!
bjs e boa sorte
Zé
Boa sorte, consigas superar este desafio. São muitos kms feitos, muitas horas gastas, valera a pena. Espero que batas o teu record.
Que pena que foi cancelada a maratona... Mas acho que foi uma boa decisão da organização. O calor era demais...!
Agora tem que voltar à Holanda para o ano outra vez (que chatice :-) )
Abraço, Sandra
(amiga da Manuela)
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